Um novo código Comercial?

Em época de crise, a primeira coisa que se busca fazer é tomar medidas para retomada do crescimento e a mudança da legislação sempre aparece como uma oportunidade. Na seara empresarial, dois projetos de lei assombram o cenário – o Projeto n. 487/2013 do Senado Federal e o Projeto n. 1.572/2011 em tramitação na Câmara dos Deputados.

Sobre o tema, já tive oportunidade de comentar o assunto em um texto escrito aqui no Blog intitulado “Um novo Código Comercial na Pós-Modernidade”, me posicionando contrária a um novo código. O ponto central está no fato de que o Estado Social, no qual nos encontramos, a formatação de um código comercial é um retrocesso. E esse entendimento não é meu exclusivo. Em junho de 2018, Haroldo Malheiros Duclerc Verçosa e Rachel Sztajn, publicaram texto intitulado “Novo Código Comercial: os empresários vão pagar essa conta”, no qual afirmam que o modelo atual que temos não é bom, mas a criação de um código comercial é pior.

Essa posição está relacionada à fragmentariedade do Direito Empresarial, mas antes de apresentar os argumentos específicos, é necessário corrigir a nomenclatura – Código Comercial.

A nomenclatura do Código Comercial

O termo Código Comercial remete ao antigo Direito Comercial, baseado nos Atos de Comércio. Essa teoria afirmada na 2ª fase do Direito Comercial, quando esse deixa de ser subjetivo e passa a ser objetivo. A teoria dos Atos de Comércio foi muito útil no início do Estado Moderno, mas conforme a sociedade foi desenvolvendo outras relações, não mais conseguiu regulamentar todas.

Entre as atividades não regulamentadas pela teoria dos Atos de Comércio estava a prestação de serviço. E a fim de tutelar essa atividade é que foi desenvolvida, por Cesare Vivante, a teoria da empresa.

Pode parecer uma mera mudança de nomenclatura, mas não é. A fim de esclarecer o tema, a algum tempo escrevi um texto, publicado no meu blog “Direito Empresarial: muito além do Direito Comercial”.

O Direito Empresarial envolve o comércio, a indústria e a prestação de serviços. Inclusive o próprio projeto de lei ao tratar do Agronegócio e outros temas, regulamenta situações que vão além do comércio em si mesmo. Desta forma, sugiro que se vamos ter um Código que esse seja um Código Empresarial.

A fragmentariedade do Direito Empresarial

Entretanto, retomando a discussão central sobre a necessidade de um Código, essa deve passar pela discussão da característica da fragmentariedade do Direito Empresarial. Isso não significa que devemos manter a regulamentação do Direito Empresarial dentro do Código Civil, mas a característica da fragmentariedade do Direito Empresarial obriga que os diversos temas que gravitam em torno desse ramo seja tratado em diversas leis, como a Lei n. 6.404/1964 e a Lei n. 11.101/2005.

Tratando sobre o tema, Rubens Requião, em sua obra Curso de Direito Comercial (V. 1, 28. ed., Saraiva: São Paulo, 2009, p. 31-32), destaca que o Direito Empresarial se caracteriza pelos seguintes traços: “cosmopolitismo, individualismo, onerosidade, informalismo, fragmentarismo e solidariedade presumida”. Especificamente sobre o fragmentarismo ele ressalta, ao citar Rocco, que: “O Direito Comercial é extremamente fragmentário. Não forma, como conclui Alfredo Rocco, um sistema jurídico completo, mas um complexo de normas, que deixa muitas lacunas.”

Essa característica também é apontada por Marlon Tomazette, em seu Curso de Direito Empresarial (V. 1, 6. ed., Atlas, São Paulo, 2014, p. 16-17), ao reconhecer um conjunto de normas muito diversificadas, em decorrência da própria diversidade das situações abrangidas.

Incorporar em um único diploma jurídico temas como o empresário – individual e societário, contratos empresariais, falência, títulos de crédito, gerará uma concentração de matérias que romperá com o fragmentarismo, além de ir em movimento contrário à descentralização e descodificação dos temas jurídicos.

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Sobre a Autora:

Nadialice Francischini de Souza

Advogada. Docente. Especialista em Direito Empresarial. Mestre em Direito Privado e Econômico, pela UFBA. Doutora em Direito pela UFBA, na linha de Relações Sociais e Novos Direitos, estudando a Governança Corporativa e o Direito de Propriedade das Ações nas S.As.

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