O que é uma Exchange e qual a sua regulamentação?

Sempre que falamos sobre criptomoedas, pensamos também nas Exchanges, mas o que são elas? e qual a regulamentação segundo o direito brasileiro?

Estabelecendo um paralelo com o mercado tradicional

Primeiramente, estabelecendo um comparativo com o mercado de valores tradicional. Entretanto, diferentemente desse mercado, onde os ativos das empresas só podem ser negociados através de corretoras de valores, regulamentadas, inscritas e fiscalizadas pela CVM – Comissão de Valores Mobiliários e pelas Bolsas de Valores, as operações das moedas digitais e tokens podem ser efetuados de três formas: 1) Corretoras (Exchanges centralizadas e descentralizadas), 2) OTC (over the counter, mercado de balcão) e 3) P2P (peer-to-peer ou pessoa-a-pessoa, sem intermediários) (LIMA; RODRIGUES, 2020, p. 75).

E o que são as Exchanges?

As Exchanges ou corretoras de criptoativos “são plataformas eletrônicas que facilitam a compra, venda e troca de moedas digitais e tokens”. Elas têm como finalidade conectar os usuários, interessados em comprar ou vender, de forma segura e garantido que a operação se concretize, de forma prática e segura. (MERCADO BITCOIN, 2020)

Tais plataformas são prestadoras de serviço, intermediando interesses dos usuários, mediante a cobrança de uma taxa ou comissão sobre as operações realizadas nos ambientes eletrônicos (virtuais).

Juridicamente, são empresas nos termos do artigo 966, do Código Civil:  “Considera-se empresário quem exerce profissionalmente atividade econômica organizada para a produção ou a circulação de bens ou de serviços”. Assim são consideradas por exercerem uma atividade de prestação de serviço de intermediação, com a finalidade econômica e interesse em obtenção de lucros.

As Exchange não são Instituições Financeiras

A grande dúvida é sobre a sua regulamentação. Com o crescente interesse de investidores no mercado de moedas virtuais, o Banco Central do Brasil, no Comunicado n. 31.379/2017, alertou que:

As empresas que negociam ou guardam as chamadas moedas virtuais em nome dos usuários, pessoas naturais ou jurídicas, não são reguladas, autorizadas ou supervisionadas pelo Banco Central do Brasil. Não há, no arcabouço legal e regulatório relacionado com o Sistema Financeiro Nacional, dispositivos específicos sobre moedas virtuais. O Banco Central do Brasil, particularmente, não regula nem supervisiona operações com moedas virtuais.

Por sua vez, a Secretaria da Receita Federal do Brasil, no art. 5º, II da Instrução Normativa n. 1.888/2019, dispôs que uma Exchange de criptoativos é “pessoa jurídica, ainda que não financeira, que oferece serviços referentes a operações realizadas com criptoativos, inclusive intermediação, negociação ou custódia, e que pode aceitar quaisquer meios de pagamento, inclusive outros criptoativos”.

Não se enquadrando como instituição financeira e não havendo regulamentação própria, uma Exchange pode se revestir sob qualquer forma empresarial: Empresário Individual, Empresa Individual de Responsabilidade Individual ou Sociedade Empresarial, se sujeitando às normas próprias do tipo escolhido por seu(s) criador(es).

De acordo com a Lei n. 4.595/1964, consideram-se instituições financeiras (art. 17) “as pessoas jurídicas públicas ou privadas, que tenham como atividade principal ou acessória a coleta, intermediação ou aplicação de recursos financeiros próprios ou de terceiros, em moeda nacional ou estrangeira, e a custódia de valor de propriedade de terceiros.”, também se equiparando a estas as pessoas físicas que exerçam as mesmas atividades, de forma permanente ou eventual (parágrafo único).

Ainda que a Instrução Normativa SRFB n. 1.888/2019 considere a Exchange de criptoativos pessoa jurídica financeira ou não, os serviços por esta prestados compreendem a intermediação, negociação ou custódia de criptoativos, podendo aceitar quaisquer meios de pagamento, inclusive outros criptoativos.

Vale destacar que no Projeto de Lei n. 3.949/2019 (SENADO, 2019) que atualmente tramita no Senado Federal, o conceito de Exchange compreende a “pessoa jurídica que oferece serviços referentes a operações realizadas com criptoativos em ambiente virtual, inclusive intermediação, negociação ou custódia.”, e condiciona o seu funcionamento a prévia autorização do Banco Central do Brasil.

Diante disso, é possível compor o seguinte quadro (BANCO CENTRAL DO BRASIL, 20–?) de pessoas jurídicas (e físicas equiparadas) reguladas pelo Banco Central do Brasil ou com alguma interferência, inclusive regulatória deste em seu funcionamento:

  • Instituição financeira:
    • Bancária: bancos comerciais; de investimento; de desenvolvimento; múltiplos; CEF; BNDES;
    • Não bancária: sociedades de crédito, financiamento e investimento; agências de fomento; associações de poupança e empréstimo; sociedades de crédito imobiliário; companhias hipotecárias; sociedades de crédito ao microempreendedor e à empresa de pequeno porte; sociedades de arrendamento mercantil; cooperativas de crédito; corretoras de câmbio; fintechs; administradoras de consórcio; instituições de pagamento; corretoras; distribuidoras;
  • Instituição não-financeira: todas as demais não enquadráveis nas atividades acima.

Como visto, as Exchanges podem se enquadrar tanto como instituição financeira não bancária ou como instituição não-financeira. Sua forma de constituição, bem como a estrutura jurídica empresarial que a revestirá, fica a cargo da vontade das pessoas que a criam, no momento da formação.

Referências

BANCO CENTRAL DO BRASIL. Comunicado n. 31.379/2017. 16 nov. 2017. Disponível em: <https://www.bcb.gov.br/pre/normativos/busca/downloadVoto.asp?arquivo=/Votos/BCB/2017246/Voto_2462017_BCB.pdf>. Acesso em 26 ago. 2021.

LIMA, Alan Schramm de; RODRIGUES, Renato Amoedo Nadier. Bitcoin Red Pill: O Renascimento Moral, Material e Tecnológico. 30 set. 2020. Disponível em: Kindle. Acesso em 26 ago. 2021.

MERCADO BITCOIN. Exchange de criptomoedas: o que é e como escolher?. 12 maio 2020. Disponível em: <https://blog.mercadobitcoin.com.br/exchange-de-criptomoedas-o-que-e-e-como-escolher>. Acesso em: 26 ago. 2021.

RECEITA FEDERAL. IN 1.888/2019. 10 jul. 2019. Disponível em: <http://normas.receita.fazenda.gov.br/sijut2consulta/link.action?visao=anotado&idAto=100592>. Acesso em 26 ago. 2021.

SENADO. Projeto de Lei n. 3949. 2019. Disponível em: <https://legis.senado.leg.br/sdleg-getter/documento?dm=7976961&ts=1630029972421&disposition=inline>. Acesso em: 29 ago. 2021.

Esse texto foi é parte do artigo escrito por Francis Augusto Queiroz Lima, intitulado O CASO BINANCE: é possível responsabilizar as Exchange por falhas com base no CDC?. Esse artigo foi publicado originalmente no livro Multidireitos IX, que pode ser adquirido no site da Editora Mente Aberta.

Os Autores:

Francis Augusto Queiroz Lima

Contador. Advogado. Pós-Graduado em Gestão Empresarial (UEFS). Pós-Graduado em Direito Tributário (UFBA). Sócio de Augusto e Carneiro Sociedade de Advogados. @francisaugustoqueiroz, @macadvogadosfsa, francisaugusto@macadvogados.adv.br

Nadialice Francischini de Souza

Advogada. Doutora em Relações Sociais e Novos Direitos (UFBA). Mestre em Direito Privado e Econômico (UFBA). Pós-Graduada em Direito Empresarial (UFBA). Docente na Pós-Graduação da UNIFACS e no CEJAS, na Graduação da UNINASSAU. @nadiafrancischinidireito.

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