A TRIBUTAÇÃO NO AGRONEGÓCIO BRASILEIRO

No Brasil, o agronegócio é setor responsável por praticamente metade das exportações, pela geração de empregos, por atrair investimentos de grande porte e representa em torno de 1/3 do PIB (Produto Interno Bruto) do país. O agronegócio diz respeito a toda a cadeia direta ou indireta que envolve a produção agropecuária e todos os equipamentos, maquinário, técnicas, tecnologias e serviços que se atrelam a esta.

Pesquisas recentes da ONU preveem o Brasil se tornando o principal exportador agro no mundo, dentro de cerca de 5 anos. Contudo, um dos elementos que mais dificultam nosso país a alcançar essa posição, ainda é a burocrática e exacerbada tributação.

São muitos os tributos incidentes sobre o agronegócio, sendo alguns deles, o ICMS (Imposto Sobre a Circulação de Mercadorias e Serviços), o IR (Imposto de Renda), seja pessoa física ou jurídica (respectivamente), INSS (Instituto Nacional de Seguridade Social), o Funrural (Fundo de Assistência ao Trabalhador Rural), dentre outros.

Contudo, além da incidência de inúmeros tributos, também há a concessão de diversos benefícios concedidos pelo Estado, além de regras específicas que viabilizam a suspensão ou a postergação no pagamento de tributos, que conferem isenções e imunidades, e até mesmo determinam alíquota zero. Alguns empresários deste setor, contudo, não conhecem as legislações correspondentes e, consequentemente, os benefícios a quem fazem jus.

Essa excessiva carga tributária com a qual os empresários do agronegócio, em maior ou menor escala, são onerados, acaba sendo um obstáculo no que diz respeito à possibilidade de investimentos, à sobrevivência das empresas do setor e à competitividade. Além de conhecer os ônus e bônus que devem recair sobre seu negócio, os empreendedores deste ramo devem apostar em medidas como o planejamento tributário, visando economizar e pagar apenas o que é, de fato, devido.

Mas, afinal, em que consiste a tributação de que tanto falar aqui. Bem, ordinariamente, é necessário destacar alguns pontos. Quando falamos em “tributação”, estamos remetendo à toda sistemática envolvida na aplicação de tributos, por parte do Estado, sobre a renda, o patrimônio, o consumo, a prestação de serviços e a circulação de mercadorias diversas.

Conforme já mencionado anteriormente, algumas medidas são adotadas pelo Estado, de modo a não inviabilizar as atividades deste setor, diante de uma alta carga tributária. Exemplo disso é a polêmica concessão de incentivos fiscais aos chamados defensivos agrícolas, que vem sendo alvo de discussões.

Destaca-se também as medidas que circundam o ICMS (Imposto Sobre Circulação de Mercadorias e Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação). Nesta senda, este imposto, regulamentado através da Lei Complementar nº 87/1996, também conhecida como “Lei Kandir”. Um dos pontos principais no que diz respeito aos benefícios concedidos aos empresários do ramo da agropecuária é Convênio ICMS nº 100 de 1997, que reduziu a base de cálculo do ICMS nas saídas de insumos agropecuários, dentre outras medidas secundárias. Em termos constitucionais, também temos a regra contida no art. 155, §2º, inciso X, alínea “a” da CF/88, que determina a não incidência de ICMS sobre operações e prestações cujas mercadorias são destinadas ao exterior (incluindo produtos primários e industrializados semielaborados). Ainda em sede de ICMS, na “Lei Kandir”, em seu art. 3º, parágrafo único, incisos I e II, traz o afastamento da cobrança deste imposto, quando da saída da mercadoria para fim específico de exportação ao exterior, com destino à empresa comercial do ramo de exportação, o que inclui estabelecimento diverso, mas da mesma empresa, tradings, armazéns da alfândega e entreposto aduaneiro.

Há ainda que se falar na isenção ao ISSQN (Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza), presente no art. 156, inciso III e §3º, inciso II da CF/88, quando da exportação destes serviços ao exterior, nos moldes do art. 2º, inciso I e do parágrafo único, ambos da Lei Complementar nº 116/2003.

O Decreto nº 7.212/2010, que regulamenta a cobrança, arrecadação e fiscalização do IPI (Imposto Sobre Produtos Industrializados), prevê imunidade sobre tal também, quando da sua destinação ao exterior. E é neste sentido que incentivos ficais como estes e muitos outros, visam auxiliar as atividades do agronegócio e suas varáveis, tornando mais viável a exportação de produtos, gerando mais empregos, riqueza e desenvolvimento ao país.

Falar em agronegócio é, sem dúvidas, um trabalho que requer uma análise pormenorizada. Os agricultores e os empresários, em geral, envolvidos com agricultura e pecuária, devem ficar atentos e analisar todos os possíveis tributos que incidem dentro da cadeia tanto de produção, quanto de comercialização. Manter-se atento e prevenir é importante, o que acaba levando os produtores e empresários deste ramo a procurar profissionais que realizem um planejamento tributário, reduzindo significativamente o risco de ser pego pelo Fisco.

Para compreender melhor a extensão desse setor, é necessário entender que as atividades rurais, como um todo, envolvem produtores, inclusive o agricultor familiar, e agroindústrias, e atingem o mercado externo, tendo grande influência em âmbito interno. Tais atividades ocorrem em propriedades rurais, sejam elas pequenas (a exemplo da agricultura familiar) ou grandes (as agroindústrias com seus inúmeros maquinários).

Assim, o conceito de produtor rural está definido no art. 165, inciso I da Instrução Normativa nº 971/2009 da Receita Federal do Brasil (RFB), sendo fundamental para estudos aprofundados sobre o setor e sua tributação respectiva. Na mesma linha de raciocínio, também devemos observar a Instrução Normativa nº 83/2001 que define em seu art. 2º o conceito de atividade rural, juntamente com o art. 249 da IN nº 1.700/2017 e com a Lei nº 9.430/1996 que ainda acrescenta o cultivo de florestas para corte (visando o consumo ou a industrialização ou a comercialização). A IN nº 87/2001 define também o que não pode ser considerada atividade rural, em seu art. 4º. Portanto, tais dispositivos são muito importantes para uma compreensão mais aprimorada acerca do tema.

Em nosso ordenamento jurídico, como um todo, observamos um tratamento um tanto quanto menos oneroso com relação ao agricultor familiar e ao pequeno produtor rural. Em 2018, tivemos o advento da Lei nº 13.606 que, neste sentido, tornou o Funrural facultativo aos produtores rurais pessoas físicas, sobre a receita bruta da produção. Ou seja, esta nova lei veio eximir estes produtores da obrigatoriedade de apurar e recolher o Funrural.

Nesta senda, é fundamental compreender ponto a ponto da tributação que envolvem as operações e os agentes inseridos na cadeia que forma o setor do agronegócio. Entretanto o tema é muito extenso, cabendo-nos demonstrar, de forma resumida, deixando clara a complexidade do setor e a necessidade de compreender melhor o assunto.

Sendo, o Imposto de Renda, um tributo de competência federal, paga-se à União. Mas quem paga? A figura do contribuinte ou do responsável. Neste sentido, é sujeito passivo aquele que recebe a renda. Entretanto devemos observar que quando temos uma fonte pagadora que recolhe em nome de outrem, estamos falando do responsável. Isso pode ocorrer, por exemplo, quando uma pessoa física trata com uma pessoa jurídica. Nesta hipótese, a Receita entende ser muito mais interessante para ela atribuir responsabilidade à pessoa jurídica (que conta com controles mais rígidos que a pessoa jurídica), para que ela efetue um recolhimento na fonte.

Além das obrigações tributárias principais, também devemos nos lembrar das obrigações de natureza acessória como a Declaração de Ajuste Anual, aplicável a todos, além das especificidades que recaem sobre o produtor rural como o Anexo de Atividade Rural ou o Demonstrativo das Atividades Rurais, que consistem em um anexo à declaração, na qual precisará as receitas, despesas e demais dados referentes à respectiva atividade rural, para localizar os benefícios que podem recair sobre aquela atividade rural. A apuração se dá por meio de escrituração no livro caixa, devendo, o produtor rural, manter toda a documentação idônea guardada por 5 anos.

Alguns Estados impõem como requisito a inscrição no CNPJ, o que não significa que, por isso, se tornará pessoa jurídica. Isto ocorre apenas pois, por diversas vezes, este recebe tratamento equiparado àquele dispensado à pessoa jurídica. Um bom exemplo disto é o proprietário de terras nas quais se explora atividade de cunho extrativista voltada a algum tipo de minério, com a finalidade de posterior fornecimento à terceiros.

Quanto a Declaração de Ajustes Anual, a obrigação nasce para certos produtores rurais, a partir de determinados rendimentos, devendo observar a limitação prevista e preencher o Demonstrativo conforme seu enquadramento. É certo, portanto, que, se tratando de Imposto de Renda, há muitos desdobramentos a que deve, o produtor rural, se atentar.

Importante destacar também que as atividades rurais que envolvem o elemento “exterior” (estrangeiro exercendo atividade rural no Brasil ou brasileiro exercendo atividade rural no exterior), não são vistas, pela legislação como atividade rural. Ou seja, não são permitidas, nestas hipóteses, algumas deduções e compensações próprias da atividade. Tão importante quanto os demais pontos destacados, é lembrar, também, que o Imposto de Renda incide sobre o ganho de capital decorrente da alienação de ativos, por parte do produtor rural, desde que não haja habitualidade na exploração desta atividade.

No que concerne o Imposto de Renda Pessoa Jurídica, se aplicam as mesmas regras empregadas a qualquer outra pessoa jurídica sendo os mesmos regime tributário, a base de cálculo, e assim sucessivamente, salvo no que tange à concessão de benefícios fiscais específicos.

Acerca do PIS e da COFINS, o fato gerador é o faturamento da empresa que, no âmbito que aqui se discute, é pertencente ao setor rural. Ambas irão incidir sobre a importação de produtos e serviços estrangeiros, tal qual nas receitas financeiras. Sendo assim, estas contribuições serão exigidas com base nos ingressos gerados pela venda de bens ou pela prestação de serviços à terceiros, e sobre as receitas decorrentes da atividade principal da pessoa jurídica em questão. Conforme (muito bem) observado pelo STF, consistiria em ônus fiscal, incluir o ICMS na base de cálculo do PIS e da COFINS, pois tal valor não diz respeito ao montante obtido com a realização da operação em questão.

Outro ponto importante sobre o PIS e a COFINS, nos obriga a destacar que a regra é a adição de um regime de não cumulatividade. Esta medida visa evitar que o produtor se exima do pagamento, deixando tal ônus para o seu sucessor na cadeia de produção rural e que este, consequentemente arque com alíquotas mais elevadas, sem ter direito ao crédito, por fim. Nesta senda, temos a Lei nº 10.925/2004, em defesa do produtor agropecuário, que reduziu as alíquotas diante da importação e comercialização de fertilizantes e defensivos agrícolas, apresentando uma lista de produtos beneficiados, concedendo também outros benefícios e imunidades. Nosso país também conta com outros diversos programas que desoneram exportações neste âmbito, a exemplo do Drawback, do Reintegra, dentre outros.

Quanto à CSLL, não há muitas ressalvas a serem feitas, devendo apenas restar destacada aqui a sua similitude na apuração, em comparação ao Imposto de Renda Pessoa Jurídica.

Já o ITR, há a necessidade latente de relembrar que há hipóteses em que, ainda que em zona urbana, caso sejam desempenhadas atividades comprovadamente rurais no imóvel, será incidente este imposto, em detrimento da incidência do IPTU. Mister salientar ainda que não devem ser considerados contribuintes as figuras do parceiro, do arrendatário e do comodatário, sob o fundamento de que estes são constituídos como tais por meio de contratos de natureza obrigacional, o que não altera o real contribuintes deste tributo frente ao Fisco. Observa-se ainda que, sendo a base de cálculo do ITR o Valor da Terra Nua, a alíquota irá variar conforme seu grau de utilização, variando de 0,03% até o percentual de 20%. Contudo, deve-se analisar o rol de imunidades que apresenta o art. 3º do Decreto nº 4.382/2002, à exemplo da pequena gleba rural.

Tal análise se faz de forma breve, sintetizando apenas alguns pontos cruciais que envolvem a tributação brasileira incidente sobre o agronegócio. A incidência de tributos neste setor da economia é muito extensa e complexa, de forma que nem mensuramos os de natureza previdenciária. A finalidade deste presente artigo é trazer a tona a carga tributária que sobrecarrega o produtor agrícola e pecuário em nosso país, produzindo uma reflexão acerca do Sistema Tributário Nacional, e ressaltar também a necessidade de um planejamento tributário bem feito, com o imprescindível acompanhamento de profissionais que possuam especialização na área tributária: advogados e contadores.

Referências:

BRASIL, 2019a. Brasil Export – Guia de Comércio Exterior e Investimentos. Brasília/DF, 2017. Disponível em: http://www.investexportbrasil.gov.br/afrmm. Acesso em: 27 de dez. de 2019.

HARET, F, 2016a. Tributação no Agronegócio. 2ª Edição. Instituto de Direito Econômico Aplicado – IDEA. São Paulo/SP, 2016.

MACHADO, H. de B. Curso de Direito Tributário. 35ª edição, revista, atualizada e ampliada. Editora Malheiros. São Paulo/SP, 2014.

Sobre a Autora:

Andréia Sousa Vaz.

Advogada graduada pelo Centro Universitário Jorge Amado (UniJorge) e pós-graduanda em Direito Tributário pela PUC Minas.

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