Rompimento da dicotomia entre o Direito Público e Direito Privado
Classicamente o direito é dividido em dois grandes grupos: o Direito Público e o Direito Privado. A teoria da dicotomia do direito remete-se ao Direito Romano e serviu como fundamentação teórica para a consolidação da Burguesia durante o período do Estado Liberal. Contudo, na Pós-modernidade a dicotomia não mais se sustenta, e estamos diante da constitucionalização do Direito Civil e da civilização do Direito Constitucional.
Direito Romano
No Direito Romano havia duas grandes divisões: o Jus Publicum e o Jus Privatum.
- O primeiro se ocupava do governo do Estado e das relações entre os cidadãos e o Estado.
- O segundo, o Jus Privatum, tinha por finalidade regular as relações entre os particulares; ele é voltado para a família, sucessão, obrigações e contratos.
Direito na Idade Média
Na Idade Média, com as invasões bárbaras e uma nova condição política em poder dos senhores feudais, a dicotomia deixou de existir. Isso porque, como o senhor feudal era o detentor das terras, acabava por ter uma concentração de poder, tanto na relação com os cidadãs como nas relações de contratos, família etc.
Revolução Francesa
Essa concentração de poder engessava as relações sociais e começou a dificultar que a burguesia se desenvolvesse. Em virtude disso, os movimentos do século XVIII, tal como a Revolução Francesa, com ideais de liberdade, fraternidade e igualdade pregava a retomada da separação entre o que era público e o privado.
Nessa formatação, o Estado, responsável pela administração do coletivo, deveria manter a unidade social de forma a interferir o mínimo possível nas relações privadas, principalmente nas relações empresariais e econômicas.
O Direito Público era representado pela participação atuante do Estado, o primado do interesse público, a superioridade da política, o afastamento da economia, a lei como regulamentadora das relações e por uma clara desigualdade entre o Estado e o cidadão.
O Direito Privado, por sua vez, era composto somente por entes privado, o primado pelo interesse privado, com ausência de interesse público, superioridade da economia, afastamento da política, o contrato como lei e a igualdade entre as partes como representativa das relações.
Como consequência da dicotomia, na area privava, houve uma acentuada proteção individual da propriedade, um escessivo formalismo contratual e uma visão patriarcalista na família. Neste sentido Hugo Garcez Duarte sustentou que:
¢ “[…] o direito privado passou a ser encarado como aquele que disciplina a sociedade civil, as relações intersubjetivas e o mundo econômico, enquanto o direito público, passou a ser concebido como ramo do direito que regula, tão-somente, a estrutura, organização e funcionamento do Estado.”[1]
Modelo liberal-burgues
Contudo, novas necessidade surgiram na sociedade e o modelo liberal-burgues não mais era capaz de responder as questões surgentes. Passou-se a ser reivindicado direitos trabalhistas, consumeristas, das mulheres, dos idosos, das minorias como uma forma geral. Também, a relação econômica passou a ter intervenção do Estado com a finalidade de controlar o abuso do poder econômico. O meio ambiente é encarado como um patrimônio de todos e que precisa ser protegido.
Esses novos valores representados na sociedade fizeram com que o direito público e o direito privado se aproximassem, tendo como base a Constituição Federal e os valores constitucionalmente garantidos.
A nova sistemática do direito exige uma administração pública mais eficiente, mais competitiva. Para tanto o Estado assume formas típicas dos entes privados através das sociedade de economia mista e empresas públicas, das parcerias público-privada, ou seja, o Estado passa a exercer a atividade econômica de forma direta.
Na área privada, os princípios e institutos típicos como a liberdade de contratar, a autonomia da vontade e o pacta sunt servanda passaram a ser relidos sob a ótica dos princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana, da solidariedade social, da igualdade matéria e da função social.
[1] DUARTE, Hugo Garcez. O direito civil constitucional: em busca de uma eficácia horizontal dos direitos fundamentais. Prisma Jurídico. Vol. 9, N. 1, jan./jun. 2010. São Paulo: Universidade Nove de Julho, 2010, p. 142.