O SUPERENDIVIDAMENTO E AS NOVAS REGRAS DO CDC
No Brasil temos mais 30 milhões de superendividados, segundo dados publicados pelo Júlia Lewgoy (2021) e a fim de proteger, tutelar e tratar essa questão, entrou em vigor no dia 1º de julho do corrente ano a Lei n. 14.181, que Altera o CDC a fim de “aperfeiçoar a disciplina do crédito ao consumidor e dispor sobre a prevenção e o tratamento do superendividamento”.
- Para explicar tudo sobre o Superendividamento e a nova regulamentação, preparei um e-book comentando os artigos da Lei n. 14.181 e que se encontra disponível na Amazon:
Mas o que é o superendividamento e o superendividado?
A fim de deixar claro sobre o que a nova legislação trata, o art 54-A, do agora alterado CDC, prevê:
Art. 54-A. Este Capítulo dispõe sobre a prevenção do superendividamento da pessoa natural, sobre o crédito responsável e sobre a educação financeira do consumidor.
§ 1º Entende-se por superendividamento a impossibilidade manifesta de o consumidor pessoa natural, de boa-fé, pagar a totalidade de suas dívidas de consumo, exigíveis e vincendas, sem comprometer seu mínimo existencial, nos termos da regulamentação.
§ 2º As dívidas referidas no § 1º deste artigo englobam quaisquer compromissos financeiros assumidos decorrentes de relação de consumo, inclusive operações de crédito, compras a prazo e serviços de prestação continuada.
§ 3º O disposto neste Capítulo não se aplica ao consumidor cujas dívidas tenham sido contraídas mediante fraude ou má-fé, sejam oriundas de contratos celebrados dolosamente com o propósito de não realizar o pagamento ou decorram da aquisição ou contratação de produtos e serviços de luxo de alto valor.
Ou seja, considera-se superendividado aquela pessoa que não consegue pagar todas as suas dívidas sem comprometer a sua sobrevivência, ou seja, sem que sobre o mínimo de recursos financeiros para que possa manter a dignidade.
Segundo o IDEC (2021), “o superendividado é aquele cuja renda está tão comprometida, que perdeu a capacidade de pagar suas dívidas, a ponto de por em risco sua subsistência, ou seja, de quitar contas básicas como alimentação e moradia”. Já Gustavo Ferrari (2021)
Superendividamento é a incapacidade econômica de quitação das dívidas contraídas, diante do saldo negativo mensal do consumidor. Ou seja, quando o rendimento mensal cobre apenas as despesas mensais e não há excedente disponível para cobrir as dívidas já realizadas. Desse modo, a dívida permanece inadimplida. O consumidor, todavia, também corre o risco de contrair novas dívidas para as quais não haverá meios de quitação.
E por que proteger e tutelar o superendividado?
Primeiramente, porque ninguém se coloca nessa posição de superendividado pelo simples querer. Segundo Cláudia Lima Marques (2016) os fatos principais para o superendividamento são os ‘acidentes da vida’, como doenças, redução de renda e desemprego. A Autora no trabalho apresenta informa que em pesquisa realizada no Observatório do Crédito e Superendividamento da UFRGS, em 5 anos de projeto-piloto de conciliação em bloco no TJRS, eram estas as ‘causa’ das dívidas dos consumidores: redução de renda (26,5%), desemprego (24,3%), doença (18,0%).
Ou seja, por fatores alheios a vontade do consumidor, muitas vezes para a própria questão da sobrevivência sua e da sua família, ele é levado a assumir obrigações que espera ser capaz de adimplir, mas não tem certeza.
Ademais, como bem salienta Claudia Lima Marques e Roberto Castellanos Pfeiffer (2021)
A necessidade de lidar com os efeitos do superendividamento não reverte exclusivamente em benefício do consumidor. Muito pelo contrário, os credores também são beneficiados se a lei for bem concebida. Sem a lei — e o consequente plano de pagamento dos débitos — há o sério risco de diversos credores (os com menores garantias) ou até mesmo a totalidade deles (tendo em vista que muitas vezes são credores sem garantia) nada receberem.
Verifica-se, desta forma, que a proteção ao superendividado proporciona um benefício para toda a sociedade:
- Para o consumidor que poderá adimplir as suas obrigações e voltar a ter uma vida financeira saudável;
- Para os credores que verão o seu crédito adimplido, ainda que não da forma como convencionada. Entretanto é melhor receber pouco e receber tudo do que não receber nada nunca;
- Para a sociedade que vê uma solução para a questão do superendividamento em si mesmo, principalmente nesse momento de crise econômico-financeira provocada pela pandemia do coronavírus.
Em resumo, se protege o superendividado – aquela pessoa que não tem condições de arcar com todas as suas dívidas sem comprometer a sua própria subsistência, com a finalidade de recoloca-la no mercado de consumo, trazendo benefícios para toda a sociedade.
- Não deixe de conferir o e-book com o comentários de todos os artigos da Lei n. 14.181 – Lei do Superendividamento, disponível na Amazon:
- Aprenda mais sobre consumo e consumismo indico o livro abaixo, também disponível para venda na Amazon:
Leia também:
- O Direito do Consumidor e o coronavírus
- Você já recebeu ligações do seu banco pedindo para confirmar seus dados pessoais e bancários?
- Tratamento de dados por parte dos advogados, como estar em conformidade com a LGPD
REFERÊNCIAS
FERRARI, Gustavo. Superendividamento do consumidor – As mudanças previstas no CDC. In Migalhas. Disponível em: <https://www.migalhas.com.br/depeso/338153/superendividamento-do-consumidor—as-mudancas-previstas-no-cdc>. Acesso em 15 jul. 2021.
LEWGOY, Júlia. Lei que ajuda 30 milhões de superendividados é sancionada com vetos. In Valor Investe. Dispónível em: <https://valorinveste.globo.com/mercados/brasil-e-politica/noticia/2021/07/02/bolsonaro-sanciona-lei-que-ajuda-30-milhoes-de-superendividados.ghtml>. Acesso em: 10 jul. 2021.
IDEC. Superendividamento? Saiba o que é e como fugir. Disponível em: <https://idec.org.br/idec-na-imprensa/superendividamento-saiba-o-que-e-e-como-fugir>. Acesso em: 15 jul. 2021.
MARQUES, Claudia Lima. Conciliação em matéria de superendividamento dos consumidores: principais resultados de um estudo empírico de 5 anos em Porto Alegre (PORTUGAL). In Estudos de Direito do Consumidor, v. 11, p. 13-43, 2016.
MARQUES, Cláudia Lima; PFEIFFER, Roberto Castellanos. Superendividamento dos consumidores: Vacina é o PL 3.151 de 2015. In Conjur. Disponível em: <https://www.conjur.com.br/2020-mai-14/garantias-consumo-superendividamento-consumidores-vacina-pl-3515-2015>. Acesso em: 15 jul. 2021.