Regime Conjugal de Participação Final nos Aquestos
Texto escrito por nossa colabora Luana Pimentel. Advogada e Pós-Graduada de Direito Tributário.
O Código Civil de 2002 inovou ao trazer mais uma modalidade no tocante aos regimes de bens em que os nubentes podem optar para constituição do direito patrimonial conjugal. Trata-se do regime de participação final dos aquestos, estabelecidos na legislação civilista no art. 1.672 e seguintes.
Trata-se de um mister entre o regime de separação total de bens e o da comunhão parcial, pois permite a livre administração dos bens na constância do matrimônio e, com a dissolução, o direito a metade do bens onerosamente adquiridos na duração do casamento, como forma de limitar as disparidades deixadas com o rompimento da relação conjugal. Nesse sentido, conceitua Silvio Rodrigues:
Representa um regime híbrido, ou misto, ao prevê a separação de bens na constância do casamento, preservando, cada cônjuge, seu patrimônio pessoal, com livre administração de seus bens, embora só se possa vender os imóveis com a autorização do outro, ou mediante expressa convenção no pacto dispensando a anuência […]. Mas, com a dissolução, fica estabelecido o direito à metade dos bens adquiridos a título oneroso pelo casal na constância do casamento. (2004. p. 194).
Nesta espécie de regime, na hipótese de dissolução do casamento, existe um cronograma contábil a seguir. O primeiro passo é afastar os bens adquiridos anteriores a celebração do casamento e após a data que cessou a convivência, bem como os bens recebidos por sucessão e os que sub-rogaram no lugar, para fins de apuração do crescimento patrimonial de cada cônjuge, pois aqui, deverá verificar o equilíbrio entre as partes.
O segundo passo é identificar se os bens auferidos na constância do casamento são divisíveis, pois quando não possui esta característica, será necessária a restituição em dinheiro para o cônjuge menos favorecido, inclusive importa em alienação dos bens para que solucione a diferença patrimonial entre os cônjuges, sendo inclusive possibilitada a alienação judicial, conforme o art. 1.684, paragrafo único.
Uma informação importante é quanto aos bens móveis, à exemplo dos carros, presumem-se adquiridos na constância do casamento tais bens, cabendo prova em contrário, ou seja, trata-se de uma presunção juris tantum, que permite uma presunção relativa dos fatos, podendo o cônjuge prejudicado provar a titularidade anterior do bem. Entretanto, para terceiros, a titularidade dos bens móveis, é presumidamente ser do cônjuge devedor, também cabendo prova em contrário.
Uma característica importante do aludido regime marital é que seu funcionamento é extremamente contabilizado, diverso do regime de comunhão parcial de bens, onde a titularidade do bem é partilhada. Neste regime, trata-se de uma grande tabela de ativos e passivos, importando a apuração de créditos, como leciona Zeno Veloso (1997, p. 205): “Não se forma uma massa a ser partilhada; o que ocorre é um crédito em favor de um cônjuge, contra o outro, para igualar os acréscimos, os ganhos obtidos durante o casamento”.
Outras tratativas são importantes explanar nesta tratativa, como as dívidas solvidas pelo outro cônjuge com patrimônio próprio, bem como, o patrimônio doado ou alienado sem a devida autorização, pois estes devem ser considerados na apuração da “tabela de ativos e passivos” como falamos anteriormente, para verificar a existência de acréscimos patrimoniais.
Nas lições de Silvio Rodrigues, tal regime é uma sociedade de fato, na qual a figura dos sócios são representados pelos cônjuges, sendo assim:
É um negócio jurídico estritamente obrigacional e a partilha do patrimônio haurido pelo esforço comum é uma imposição da justiça para evitar o enriquecimento de um dos sócios, em detrimento do outro. (2004, p. 193).
Dessa forma, nas palavras de Carlos Roberto Gonçalves (2017), este regime marital pode atrair aqueles que exercem atividades empresárias, pois a livre administração é a palavra chave desta modalidade, permitido, por exemplo, o aluguel de imóveis, ou integralização de um ou mais bens na empresa, sem ter que dispor dos benefícios do regime de comunhão de bens.
Por fim, é importante lembrar que se este regime conjugal interessa para você, mesmo sendo casado, poderá ser sua realidade, em razão do art. 1.639, § 2º, em razão do princípio da autonomia da vontade, que reforça a ideia da possibilidade de mutabilidade do regime conjugal, desde que, autorizado judicialmente e requerido por ambos os cônjuges e devidamente justificado.
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Referências:
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro – Direito de família. V. 6., 14. ed. São Paulo: Saraiva, 2017.
MONTEIRO, Washington Barros; SILVA, Reina Beatriz da. Curso de Direito Civil –– Direito da Família. V. 2, 42. ed. São Paulo: Saraiva, 2012.
RODRIGUES, Silvio. Direito Civil – Direito de Família. V. 6 – 28. Ed. São Paulo: Saraiva, 2004.
VELOSO, ZENO. Regimes matrimoniais de bens. In: Direito de família contemporâneo. PEREIRA, Rodrigo da Cunha (coord.). Belo Horizonte: Del Rey, 1997.